O
TROPEIRISMO NO BRASIL
Final
da parte 8:
Quando os interesses coincidiam, os dos proprietários sulinos e os do Império,
as forças regulares e irregulares lutavam juntas com predomínio destas. Havia,
entre elas, contradições também. Nesse caso, deflagravam em lutas. A Farropilha
foi a mais destacada. Emergiu, nesse conflito, o velho contraste marcado pelas
reminicências heróicas da Campanha entre as duas áreas de colonização. De um
lado, os estancieiros à frente dos gaúchos pobres, que formavam a sua tropa e a
sua peonagem. Do outro, os elementos dependentes da autoridade pública - a
população estável, pertencente à classe média das cidades, do litoral marítimo
e lagunar e das regiões onde a colonização alemã começara a ser introduzida a
partir de 1824.
A rebelião
dos farrapos teve início em
Porto Alegre (atual capital do Rio grande do Sul), mas teve na
Campanha a sua base de sustentação e tinha como objetivo tornar-se
independente do Brasil, pois a eles o governo central devia grande quantia de
fornecimento não pagos; a sua produção e ao seu comércio o império
tributava com rigor para auferir rendas que saía da província.
* * *
Parte
9: Ao assumir
o comando das forças destinadas a por fim a esta rebelião, que empobreceu
e arruinou propriedades, Duque de Caxias ofereceu paz honrosa e acenou com
perspectivas de um novo acordo entre os senhores da Campanha e o Império; e
nova intervenção nas questões platinas envolvendo as ricas pastagens ao sul do
Ibicui. A situação ali caminhava para uma crise militar - uma solução
tradicional e antiga. Os proprietários brasileiros da Banda Oriental, agora
estado autônomo, exigiam constantemente a proteção do governo central. A
fronteira voltava a ser cenário de lutas constantes entre estancieiros que
operavam por conta própria.
Os tratados
anteriores de limites e todos os acordos até então assinalados deixavam a
região ao sul do Ibicui aos orientais. Nela a população e os proprietários
brasileiros somavam a maioria. Essa realidade continha a origem dos conflitos
sucessivos caracterizando a fronteira do Ibicui como uma zona de transição
sempre conflagrada. A luta contra Rosas - ditador argentino - conduzida do Rio
Grande do Sul por Duque de Caxias mobilizou os sobreviventes da luta Farropilha
e conduziu a um acordo razoável entre os estancieiros e o governo imperial na
esperança de, com a vitória de Caseros, por fim a esta situação já prolongada e
insustentável. Os acordos assinados com os aliados brasileiros do Estado
Oriental, chefiados pelo general Flores, definiu a entrega dos campos ao sul do
Ibicui ao Brasil. Pela primeira vez a linha do Quaraí surge no mapa como
fronteira sulina.
Luís Alves de Lima e Silva, Duque de Caxias (1803-1880)
O quadro
geral da Campanha é alterado outra vez com o advento da carne e instalação dos
frigoríficos responsáveis por uma nova e importante mudança de ordem social,
política e econômica. Nesse tempo, o fator imigração determinou o predomínio do
tipo de população oriunda do litoral e da bacia do Guaíba; influenciou na
diferenciação sucessiva da gente da Campanha. A luta federalista foi o seu
último arremesso. Consolidada a República, a Campanha ficou reduzida ao
controle do poder central e os vestígios de uma época foram eliminados.
Fim
Belo
Horizonte, 27 de março de 2008
PEDRAS QUE FALAM
Há dias, estava eu a tomar um café e
a comer um rissol quando a Polícia Municipal chegou com o reboque para a
remoção de carros mal estacionados. Logo levou um que se encontrava com duas
rodas sobre o passeio frente ao bistro em que eu me encontrava. Ainda
não tinham – reboque e rebocado – passado a esquina lá ao fundo da rua e já
dois carros disputavam o lugar de que o anterior tinha sido removido. Foi
necessário o cavalheiro que, ao meu lado, estava de pé ao balcão dizer-lhes o
que tinha acabado de acontecer para seguirem com a discussão para outro lugar.
Ou seja, nesta cena tão breve quanto profana, houve quem contasse a história
mas dá para imaginar a ignorância de todos aqueles que passam sobre as pedras
da rua sem imaginarem o que por ali mesmo se passou há pouco ou há muito. E se
há episódios que podem ser importantes para os interesses imediatos dos
incautos – a Polícia Municipal voltar ali para continuar a rebocar carros mal
estacionados – outras situações haverá cujo conhecimento nos pode dar um grande
sentido de responsabilidade pelos passos que damos sobre certas pedras.
Saber que nos encontramos no local
exacto em que o Rei D. Dinis perguntou à Rainha D. Isabel o que levava no
regaço tendo ela respondido que «São rosas, Senhor», que foi daquele preciso
local que D. Nuno Álvares Pereira assistiu ao fecho da abóbada do Convento do
Carmo e que uns séculos mais tarde dali mesmo o Capitão Salgueiro Maia
desmoronou o Império, que ali, naquela sala do castelo de Palmela, o Rei D.
João II apunhalou o Duque de Viseu, saber que foi sob aqueles arcos do seu Paço
sobre a foz do Tejo que o Rei D. Manuel viu a armada de Vasco da Gama zarpar
para a Índia e que naquele outro arco estava a porta que entalou Martim Moniz…
«São
rosas, Senhor»
Pisar essas pedras dá-nos uma certa
solenidade, um verdadeiro sentido de responsabilidade histórica. Isso mesmo
senti quando espalmei uma mão sobre as pedras do Forte d’Aguada em Goa e
imaginei o que elas “viram” antes de eu ali chegar… Não somos nós que somos
importantes por ali estarmos naquele lugar; apenas nos enforma o sentido do
respeito histórico, cultural. E imaginamos…
Porta
do Castelo de S. Jorge, Lisboa - por Francisco Gomes de Amorim
Imaginamos o vazio daqueles que
ignoram o que se passou e, pior ainda, o deserto mental daqueles que nem sequer
querem saber.
Mas cheguei à conclusão de que,
felizmente, as pedras são inertes.
Imagine-se o que seria se elas
reagissem a estímulos. Devia ser um tremor constante com algumas a saltar mais
que outras conforme o que cada uma tivesse “visto”. Haveria mesmo as que
levitariam.
O que aconteceria às calçadas de
Lisboa por que passaram Camões e Herculano quando fossem pisadas por
analfabetos boçais e bêbados de destino incerto?
E a que altura subiriam aquelas de Königsberg que durante
mais de meio século foram pisadas por Emmanuel Kant quando os soldados nazis as
pisaram com botas fanáticas e quando os alienados bolcheviques a transformaram
em Kaliningrad?
É este sentido de responsabilidade histórica que a todos
deveria motivar. Bastaria que tivessem interesse. Bastaria que fossem cultos. E
ser culto não é saber muitas coisas: é querer saber o significado das que se
conhecem e estar aberto a conhecer outras mais.
É que, apesar de serem inertes, as pedras contam-nos muito
e podem conduzir-nos à sabedoria, estado que só se alcança se percebermos o que
nos rodeia.
Dá para imaginar quanto problema poderia ter sido evitado
se os líderes históricos não mentissem como hoje é banal e tivessem tido esta
preocupação cultural básica: a busca do significado.
Lisboa, Março de 2008
Henrique Salles da Fonseca
tags: cultura
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por Henrique Salles da Fonseca às 10:33
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Sábado, 29
de Março de 2008
A doença do
século XXI
"A
criança doente"
Edvard
Munch (1863-1944)
A
projeção de uma vida mais longa para o homem, através da possibilidade de
diagnósticos precoces de doenças e do acesso a novos e eficientes medicamentos,
e as exigências crescentes da sociedade atual têm trazido situações de
estresse que desencadeiam manifestações e sintomas de depressão, a quinta
doença mais freqüente no mundo de hoje, segundo a OMS.
Por
motivos discutíveis e não definitivos, como as alterações hormonais e o estilo vida mais
desgastante, com duas a três jornadas de trabalho diário, a mulher é a
vitima mais freqüente dessa patologia, na relação de duas mulheres para cada
homem. Fatores de origem genética, hereditários e familiares, também são determinantes.
Filhos de pais que sofrem distúrbios depressivos têm 30% mais chance de
desenvolver a doença.
A
antiga doença da alma, a depressão, é organicamente determinada pela baixa
produção de dois
neurotransmissores (substancias que propagam os estímulos
nervosos cerebrais), a serotonina (promotora da motivação,
energia e atenção) e a noradrenalina (influi no apetite e
impulsividade) que juntas regulam o humor e as funções
cognitivas. Clinicamente é caracterizada pela perda de interesse ou prazer em
todas as atividades, pelo humor deprimido, por alterações do sono e do apetite,
pela fadiga constante, pelo sentimento de impotência e inutilidade, pela
diminuição da capacidade de pensar e de se concentrar, e até, em alguns casos,
pelas tendências suicidas. É importante diferenciar esses sinais e sintomas de
outras situações que têm uma causa definida, como a tristeza (luto, perdas,
etc.), que é passageira, e outras patologias hormonais (tiroidianas) e drogas.
Como
é uma doença que atinge principalmente o emocional da pessoa, muitas vezes é
não adequadamente avaliada e tratada.
Os
tratamentos modernos são cada vez mais eficazes. Combinação de apoios
profissional e medicamentoso e até utilização do eletrochoque, procedimento
agora mais seguro, acompanhado por computador e anestesista, indicado, por
exemplo, em casos graves de pacientes gestantes ou lactantes que não podem
receber medicações antidepressivas.
Houve
época em que as pessoas depressivas eram até consideradas criativas, coisa
duvidosa, pois é sabido que a maioria fica apática e improdutiva. Marilyn
Monroe e a princesa Diana , a Lady Di, são exemplos de indivíduos famosos
que tiveram durante a vida sinais de depressão.
Apesar
das orientações profissionais e das medicações cada vez mais potentes e
seguras, as tensões e solicitações do mundo moderno estão levando pessoas de
todas as idades e sexos, níveis socioeconômicos, raças e culturas, a um aumento
de casos de depressão, doença que atinge uma geração cada vez mais
individualista, competitiva e sozinha.
Maria
Eduarda Fagundes
Uberaba,
26/03/08
tags: saúde
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por Henrique Salles da Fonseca às 07:38
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Sexta-feira,
28 de Março de 2008
CURIOSIDADES
QUASE OCULTAS DA HISTÓRIA
Nasceu
cerca do ano 450 da era cristã em Faughart perto de Dundarlk naquela ilha a que
então se chamava Ibérnia e morreu em Kildare no dia 25 de Fevereiro de 525. Foi
enterrada em Downpatrick junto dos túmulos de São Patrício e de São Colombo.
Todos eles são hoje os padroeiros da Irlanda.
Filha
do chefe de Leinster e de Brocca, uma das escravas da corte ibérnia, Brígida
foi baptizada por Patrício, o monge que viria a ser canonizado e professou em
Croghan onde foi ensinada por Mel de Armagh, outro monge que também viria a
subir aos altares.
Em
470 fundou o mosteiro de Cill-Dara (Kildare em língua inglesa) assim se
tornando a primeira Abadessa da primeira comunidade monacal feminina em toda a
Ibérnia. Ali fundou uma escola e iniciou a construção da Catedral. Vários
milagres lhe são atribuídos nomeadamente aquele que se conta sobre a
transformação da água em leite para dar a uma criança com fome e o de um barril
de leite por ela enviado para um vilarejo próximo que não se esvaziou enquanto
todas as crianças do local não estavam alimentadas. No final de saciadas as
crianças, do mesmo barril passou a jorrar cerveja destinada aos adultos. Diz a
tradição que as vacas de Brígida davam leite três vezes por dia a fim
satisfazer as necessidades de todos os pobres dos arredores da Abadia. Por este
tipo de razões, a arte litúrgica a representa habitualmente com uma vaca a seu
lado.
Brígida
demonstrou uma extraordinária vida religiosa, interminável compaixão e um
grande vigor para espalhar a Fé.
Em
Inglaterra existem 19 igrejas que lhe são dedicadas sendo a de Londres a mais
importante; na Escócia há duas e vários locais de Gales têm o nome
“Llansantaffraid” que significa “Igreja de Santa Brígida”; em Itália há igrejas
de Santa Brígida em Piacenza e em Fiesole.
A
sua túnica encontra-se no Santuário de São Donato, na Bélgica e um sapato está
no Museu de Dublin mas em 1283 foi decidido que a sua cabeça fosse enviada para
a Terra Santa. Disso se encarregaram três cavaleiros que transportaram o crânio
da Santa com a maior solenidade.
Fazendo
escala em Lisboa, não terão tido os modos convenientes a uma perfeita harmonia
com as autoridades locais pelo que, entrando em conflito aberto, foram mortos
no campo do Lumiar.
O
crânio de Santa Brígida ficou como relíquia de grande veneração na capela ali
existente e os três cavaleiros foram sepultados em nichos abertos na parede
norte do templo.
A
actual Igreja paroquial do Lumiar data de 1603, guarda a venerável relíquia e
exibe na sua parede norte os três túmulos dos cavaleiros ibérnios que ali foram
pelejar e morrer. O seu Orago é S. João Baptista. Porquê?
Foi
durante o velório de pessoa amiga que descobri os túmulos e a lápide que os
explica.
Lisboa,
Março de 2008
Henrique
Salles da Fonseca
BIBLIOGRAFIA:
tags: história
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por Henrique Salles da Fonseca às 08:58
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Quinta-feira,
27 de Março de 2008
L'INTERNATIONALISATION
DE L'AMAZONIE
Interview du ministre Brésilien de l'Éducation aux Etats-Unis.
Quelle que soit l'insuffisance de l'attention de nos gouvernements pour ce patrimoine, il est nôtre. En effet, en tant que Brésilien, je m'élèverais tout simplement contre l'internationalisation de l'Amazonie.
En tant qu'humaniste, conscient du risque de dégradation du milieu ambiant dont souffre l'Amazonie, je peux imaginer que l'Amazonie soit internationalisée, comme du reste tout ce qui a de l'importance pour toute l'humanité.
Si, au nom d'une éthique humaniste, nous devions internationaliser l'Amazonie, alors nous devrions internationaliser les réserves de pétrole du monde entier. Le pétrole est aussi important pour le bien-être de l'humanité que l'Amazonie l'est pour notre avenir. Et malgré cela, les maîtres des réserves de pétrole se sentent le droit d'augmenter ou de diminuer l'extraction de pétrole, comme d'augmenter ou non son prix.
De la même manière, on devrait internationaliser le capital financier des pays riches. Si l'Amazonie est une réserve pour tous les hommes, elle ne peut être brûlée par la volonté de son propriétaire, ou d'un pays. Brûler l'Amazonie, c'est aussi grave que le chômage provoqué par les décisions arbitraires des spéculateurs de l'économie globale. Nous ne pouvons pas laisser les réserves financières brûler des pays entiers pour le bon plaisir de la spéculation.
Avant l'Amazonie, j'aimerai assister à l'internationalisation de tous les grands musées du monde. Le Louvre ne doit pas appartenir à la seule France. Chaque musée du monde est le gardien des plus belles oeuvres produites par le génie humain. On ne peut pas laisser ce patrimoine culturel, au même titre que le patrimoine naturel de l'Amazonie, être manipulé et détruit selon la fantaisie d'un seul propriétaire ou d'un seul pays.
Il y a quelque temps, un millionnaire japonais a décidé d'enterrer avec lui le tableau d'un grand maître. Avant que cela n'arrive, il faudrait internationaliser ce tableau.
Pendant que cette rencontre se déroule, les Nations Unies organisent le Forum du Millénaire, mais certains Présidents de pays ont eu des difficultés pour y assister, à cause de difficultés aux frontières des Etats-Unis. Je crois donc qu'il faudrait que New York, lieu du siège des Nations Unies, soit internationalisé. Au moins Manhattan devrait appartenir à toute l'humanité. Comme du reste Paris, Venise, Rome, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, chaque ville avec sa beauté particulière, et son histoire du monde devraient appartenir au monde entier.
Si les Etats-Unis veulent internationaliser l'Amazonie, à cause du risque que fait courir le fait de la laisser entre les mains des Brésiliens, alors internationalisons aussi tout l'arsenal nucléaire des Etats-Unis. Ne serait-ce que par ce qu'ils sont capables d'utiliser de telles armes, ce qui provoquerait une destruction mille fois plus vaste que les déplorable incendies des forêts Brésiliennes.
Au cours de leurs débats, les actuels candidats à
Commençons donc par utiliser cette dette pour s'assurer que tous les enfants du monde aient la possibilité de manger et d'aller à l'école. Internationalisons les enfants, en les traitant, où qu'ils naissent, comme un patrimoine qui mérite l'attention du monde entier.
Davantage encore que l'Amazonie. Quand les dirigeants du monde traiteront les enfants pauvres du monde comme un Patrimoine de l'Humanité, ils ne les laisseront pas travailler alors qu'ils devraient aller à l'école; ils ne les laisseront pas mourir alors qu'ils devraient vivre.
En tant qu'humaniste, j'accepte de défendre l'idée d'une internationalisation du monde. Mais tant que le monde me traitera comme un Brésilien, je lutterai pour que l'Amazonie soit à nous. Et seulement à nous!
La presse " nord-américaine" a refusé de publier ce texte!
Contributo de
Luís Soares de Oliveira, Embaixador
tags: política
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por Henrique Salles da Fonseca às 14:11
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Quarta-feira,
26 de Março de 2008
Burricadas
nº 26
Ai,
Alan, Alan. que rica herança nos deixaste - III
v Se
outro mérito a presente crise financeira não tivesse, teria pelo menos este de
nos mostrar que a instrumentalização das taxas directoras não é medida que as
Autoridades Monetárias possam usar e abusar a seu bel’ prazer: uma economia só
tolera situações de ineficiência
dinâmica em conjunturas excepcionais e por prazos relativamente
curtos (eis um ponto a favor do BCE).
v No
plano da estabilidade dos sistemas financeiros (isto é, da supervisão
prudencial), outras lições mais estão já aí para quem as quiser ver. Desde
logo, recorda-nos que a criação de liquidez mediante operações de crédito
bancário tem por contrapartida inevitável a exposição dos Bancos ao risco de crédito.
v Se
a expansão da liquidez (ou massa monetária) for muito rápida, várias questões
devem preocupar, então, os supervisores: Como está a evoluir a perda esperada e
a perda máxima provável em que cada Banco incorre? Permanecem invariantes? Ou
estão a deslocar-se? Se as perdas esperadas forem, agora, outras, será que os
Bancos as repercutem correctamente no preço do dinheiro? E se as perdas não
esperadas (isto é, a diferença entre a perda máxima provável e a perda
esperada) aumentarem, será que os capitais próprios dos Bancos continuam a
poder comportá-las?
v É
que na génese desta crise não estiveram só taxas directoras que colavam a
economia norte-americana a um cenário de ineficiência
dinâmica. No mercado interbancário, as taxas de juro negociadas
raramente levavam em linha de conta o risco
de crédito que a contraparte tomadora (Banco ou Thrift) representava. E
nas operações de crédito hipotecário residencial, pelo menos nestas, os preços
praticados (isto é, as taxas de juro e as comissões a pagar pelo mutuário)
também não eram fixados com especial acerto.
v Tivessem
os supervisores (nos EUA há três Autoridades de Supervisão: o FED, o Office of the Comptroller of the Currency e o Office of Thrifts Supervision)
dedicado mais atenção ao que se passava nos mercados interbancários, e
dificilmente muitos Bancos (e muitas Thrifts)
teriam conseguido financiar, ainda que por períodos curtos, as suas carteiras
de créditos hipotecários a custo tão baixo.
v Tivesse
havido, por parte daqueles supervisores, uma leitura mais perspicaz da agitação
que se vivia no mercado hipotecário, e as condições aí oferecidas teriam sido
outras, certamente menos cativantes para novos e velhos devedores (uma boa
parte das operações subprime,
como vimos, assenta em 2ªs hipotecas, os tais Home Equity Loans; outra parte não menos importante
consiste em créditos hipotecários sobre residências secundárias, cujos
devedores têm pelo menos mais outro empréstimo hipotecário para pagar).
v Verdade
seja dita, não foi esta crise que veio mostrar quão importante é para a
estabilidade dos sistemas financeiros que o preço do dinheiro inclua a perda
esperada (a chamada cobertura
horizontal do risco
de crédito) - essa é uma das regras de ouro do Novo Acordo de
Basileia (Basileia II) e sobre ela está ser construída a nova arquitectura do
sistema financeiro internacional.
v Mas
é uma regra que tem um triplo efeito, que a teoria ainda mal reconhece: (a)
torna muito menos prováveis os cenários de ineficiência
dinâmica; (b) rouba eficácia às estratégias de política monetária em preço (isto é, as
estratégias baseadas na instrumentalização das taxas directoras); (c) acentua a
natureza pró-cíclica dos modelos de supervisão que se inspirem em Basileia II.
v Neste
novo quadro, é toda a concepção tradicional da política monetária que tem de
ser repensada. Os Bancos não são mais entidades neutras que a Autoridade
Monetária pode tratar por igual no contexto dos mercados interbancários - quais
retransmissores dos estímulos monetários que não distorcem o sinal.
v Pelo
contrário, para assegurar a estabilidade do sistema bancário e o ambiente
competitivo entre os Bancos, o Banco Central, também ele, tem de observar a
regra de ouro que preceitua a cobertura
horizontal do risco
de crédito, acima referida.
v Isto
significa que o Banco Central deve saber distinguir entre os Bancos, seus
contrapartes, não tanto em função da respectiva dimensão, como ainda hoje
acontece nas operações de open
market (os leilões de liquidez organizados pelo Banco Central),
mas, isso sim, à luz do grau de adequação dos respectivos capitais ao risco a
que se encontrarem expostos. O que é dizer, do risco sistémico que representem
aos olhos do supervisor.
v Dito
de outro modo: os Bancos Centrais ao tratarem todos os Bancos por igual
(descontadas as respectivas dimensões), no âmbito dos leilões de liquidez,
incentivam (ou, pelo menos, não contrariam) comportamentos oportunistas em
matéria de exposição ao risco, designadamente o risco de crédito. E foi isso
precisamente o que aconteceu, anos a fio - nos EUA e em praticamente todos os
países do mundo.
v É
claro que tudo isto suscita uma série de perguntas incómodas: Estão as
Autoridades de Supervisão em condições de avaliar o perfil do risco a que os
Bancos (supervisionados e que são simultaneamente contrapartes nas tais
operações de open market)
se encontram expostos? Com que métodos? E como vão ser esses métodos aferidos?
v Não
bastava esta crise ter-nos mostrado que, na condução da política monetária, a
exposição do sistema financeiro ao risco e o nível de capitalização dos Bancos
(e de outras Instituições de Serviços Financeiros) são parâmetros tão ou mais
importantes que as taxas directoras e o ritmo de expansão da liquidez (massa
monetária) na economia.
v Veio
ensinar-nos também: (a) que o funcionamento dos mercados interbancários, contrariamente
ao que se julgava, não favorecia a estabilidade dos sistemas financeiros; (b)
que a disciplina do mercado (o 3º pilar de Basileia II) passa também pelos
Banco Centrais, igualmente sujeitos à regra de ouro já mencionada nas operações
de open market; (c) que a
disciplina do mercado, para funcionar, faz apelo a modelos de medição do risco
de crédito que ainda não foram testados – e com os quais as Autoridades de
Supervisão estão ainda pouco familiarizadas; (d) enfim, que, com a disciplina
do mercado, as estratégias tradicionais da política monetária são provavelmente
bem menos eficazes do que se pensava. (cont.)
Lisboa, Março de 2008
A. PALHINHA MACHADO
tags: finanças
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por Henrique Salles da Fonseca às 14:18
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Terça-feira,
25 de Março de 2008
O PÚBLICO
Nova
ferramenta on-line
24.03.2008
- 17h10
As notícias
do PÚBLICO na Internet passam a ter ligação directa para os blogues que as
comentam, através de uma nova ferramenta que hoje entra em funcionamento. O
objectivo desta medida é ajudar "na difusão das conversas que se geram na
blogosfera sobre as notícias, transformando os níveis de participação no
próprio site", explica um comunicado da empresa.
Colocada exactamente por baixo da fotografia, em lugar de destaque, uma pequena caixa dará conta do que se está a escrever na blogosfera sobre aquela notícia em concreto, aumentando as possibilidades de ligações entre os "bloggers" e o próprio jornal. Esta é a primeira vez que o site do PÚBLICO faz ligações directas com frequência para fora do seu próprio site.
A ferramenta em causa, Twingly, é usada por alguns jornais europeus, como o "Politiken", na Dinamarca, e tem apresentado bons resultados na criação de uma comunidade de leitores mais participativos. Nos últimos meses, o site do PÚBLICO tem vindo a ver crescer exponencialmente os comentários on-line, que passaram de 6717 em Outubro de 2007 para 24.140 em Fevereiro.
Colocada exactamente por baixo da fotografia, em lugar de destaque, uma pequena caixa dará conta do que se está a escrever na blogosfera sobre aquela notícia em concreto, aumentando as possibilidades de ligações entre os "bloggers" e o próprio jornal. Esta é a primeira vez que o site do PÚBLICO faz ligações directas com frequência para fora do seu próprio site.
A ferramenta em causa, Twingly, é usada por alguns jornais europeus, como o "Politiken", na Dinamarca, e tem apresentado bons resultados na criação de uma comunidade de leitores mais participativos. Nos últimos meses, o site do PÚBLICO tem vindo a ver crescer exponencialmente os comentários on-line, que passaram de 6717 em Outubro de 2007 para 24.140 em Fevereiro.
tags: internet
publicado
por Henrique Salles da Fonseca às 15:33
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ÍNDIA - 4
O TIGRE DE AÇO
Há
quem diga da economia indiana que “o tigre está em perigo de vida”.
A
afirmação foi abundantemente proferida durante a discussão parlamentar do
Orçamento para 2008 (o ano fiscal começa em 1 de Abril) pretendendo com isto
criticar a política cambial em
curso. Por seu lado, o Ministro das Finanças, Palaniappan
Chidambaram, justifica a valorização da Rupia com o combate à inflação ao que
os opositores replicam com a demagogia pré-eleitoral que, essa sim, introduz
elevadas pressões inflacionistas no sistema.
E
que realidades estão por detrás destas afirmações?
A
valorização por que a Rupia vem passando resulta de um significativo saldo
positivo na Balança de Transacções Correntes tanto na componente das trocas
comercias como das transferências para a Índia de vultosas verbas com origem
nas poupanças dos emigrantes e no IDE sem que o Banco da Reserva intervenha no
sentido da desvalorização. Contudo, essa política tem o reverso que se traduz
na inviabilização dos Sectores exportadores de relativamente baixa tecnologia,
de mão-de-obra barata, de magro valor acrescentado. O sector têxtil de
confecções está a ser severamente castigado e as deslocalizações já se fazem no
sentido de países com moedas mais fracas de que sobressaem o Vietname, a China,
a Indonésia e o Sri Lanka.
Mas
o Ministro das Finanças responde que nos últimos três anos a taxa média de
crescimento do PIB foi de 9% e isso permite-lhe preocupar-se com o poder de
compra das classes mais desfavorecidas que não poderiam sobreviver num processo
inflacionista resultante de uma politica cambial diferente. Ao que a oposição
lhe responde com a falta de consolidação orçamental: a inverdade do anúncio de
défices de 3,1% para este ano e de 2,5% para 2009 pois nessas contas não estão
considerados os aumentos do funcionalismo público que o Partido do Congresso
sempre faz nas vésperas de eleições. E esse aumento já representa um agravamento
de mais 3,5% no défice de 2008, verbas essas totalmente dedicadas ao consumo.
Implicando, portanto, uma enorme tensão inflacionista. Se a esta benesse
destinada aos cerca de 10 milhões de funcionários públicos somarmos o perdão
total das dívidas bancárias acumuladas por cerca de 30 milhões de pequenos
agricultores, dá para imaginar a que nível irá chegar o défice neste ano fiscal
eleitoral e que tensões inflacionistas serão geradas.
Nos
últimos três anos a produção agrícola vem crescendo cerca de 3% ao ano
confirmando a autosuficiência alimentar do país alcançada há mais de uma década
e essa dinâmica vem sendo da maior importância na Indústria a qual beneficia
desde a independência em 1947 de uma perene política mercantilista, de forte
protecção pautal e de proibição de certas importações.
A
política educacional e de formação profissional assumiu uma responsabilidade
muito grande na sustentação das políticas conducentes à autosuficiência
alimentar e industrial e se em tempos a Índia exportava mão-de-obra sem
formação, actualmente o cenário é bem diferente e a procura de recursos humanos
indianos é uma das justificações para os actuais fluxos de IDE no país.
Assim
se criaram estruturas industriais que cresceram para notáveis dimensões. É
conhecida a trajectória internacional da indústria indiana de conteúdos
informáticos e, mais espectacularmente, a dinâmica do sector siderúrgico.
E
assim começam os problemas com a protecção da produção nacional. Efectivamente,
se a Índia aborda os mercados externos com a dinâmica de que vem dando provas,
lógico é que tenha que dar contrapartidas liberalizando o acesso dos
estrangeiros ao seu mercado doméstico.
O
problema está em saber se a indústria indiana está em condições de competir com
a concorrência que lhe venha brevemente a ser feita no seu próprio território,
não em termos de preços mas sim em qualidade.
Agora
é que vamos ver se o tigre é mesmo de aço.
Lisboa,
Março de 2008
Henrique
Salles da Fonseca (na Mesquita de Deli)
tags: índia
publicado
por Henrique Salles da Fonseca às 09:14
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Segunda-feira,
24 de Março de 2008
Burricadas
nº 25
Ai,
Alan,Alan, que rica herança nos deixaste - II
v Faz
anos que O. Blanchard (um nobelizável) veio chamar a atenção para o conceito de
eficiência dinâmica,
a propósito do peso da Dívida Pública no PIB: uma economia encontra-se em
situação de eficiência
dinâmica se a taxa de crescimento do PIB nominal for inferior ao
custo efectivo (uma taxa nominal também) da Dívida Pública. A eficiência reside, então,
no facto de o endividamento público conhecer um limite explícito – e dinâmico, também, dado que
actua qualquer que seja a taxa de crescimento do PIB nominal.
v Num
cenário de ineficiência
dinâmica, pelo contrário, os juros da Dívida Pública podem ser
integralmente capitalizados que, mesmo assim, o peso da Dívida Pública no PIB
nominal vai-se reduzindo progressivamente.
v Acontece
que este conceito de eficiência
dinâmica tem virtudes que não se esgotam na gestão “macro” da
Dívida Pública. Por exemplo, a propósito do mercado imobiliário, ou dos
sistemas financeiros.
v No
mercado imobiliário, se os preços de imóveis e terrenos crescerem a uma taxa superior
ao custo do dinheiro (ineficiência
dinâmica), faz sentido cada um endividar-se o mais possível para
investir nuns e noutros, na certeza de que, a breve prazo, as mais valias que
vai obter dar-lhe-ão para pagar essas dívidas e ainda ficará com um lucro
jeitoso. É o conhecido rodopio entre preços no mercado imobiliário e taxas de
juro nominais: quanto mais estas caem, mais aqueles sobem (o inverso nem sempre
é verdadeiro).
v Nos
sistemas financeiros, as coisas passam-se de modo ligeiramente diferente. Aí,
numa situação de ineficiência
dinâmica, as taxas de retorno oferecidas pelos instrumentos de
dívida (empréstimos, Obrigações) são facilmente superadas pelas mais valias que
a esfera real da economia (commodities,
imóveis e bens em geral) promete. Em tais circunstâncias, não é nada fácil para
Bancos e Entidades de Investimento Colectivo (que operam predominantemente na
esfera nominal da economia) reterem o interesse dos investidores – os quais
podem obter taxas de retorno bem mais atraentes com a simples compra e venda (carry trade) de bens
transaccionáveis, ou de direitos sobre bens transaccionáveis.
v Mesmo
o mercado de Acções, que faz a ponte entre a esfera real e a esfera nominal de
uma economia, quando em ambiente de ineficiência
dinâmica, evolui, num primeiro momento, como se elas fossem as commodities mais fáceis de
transaccionar – e assiste-se invariavelmente à explosão das cotações.
v O
problema é que os preços não aumentam indefinidamente, nunca. E quando uns
quantos crescem muito rapidamente, a estrutura dos preços relativos acaba por
se alterar –o que desequilibra as intenções e as expectativas tanto dos
investidores como de um grande número de outros agentes económicos, com
reflexos imediatos no nível da actividade económica e na composição do PIB.
v Vem
isto a propósito da medicação Greenspan para os choques económicos adversos.
Partindo de duas ideias nunca demonstradas (as bolhas especulativas nos
mercados financeiros esvaziam-se por elas próprias; os prejuízos dos investidores
ficam sempre circunscritos à esfera nominal), prescreveram-se sistematicamente
dois princípios activos: (a) taxas directoras baixas, para evitar que a
actividade económica decaísse; (b) liquidez abundante, para manter o sistema de
pagamentos a funcionar.
v Se
a economia estivesse estagnada, ou mesmo em recessão, a medicação Greenspan não
desencadearia efeitos colaterais nocivos – sempre que preservasse a eficiência dinâmica. Mas já em fase
de expansão (como foi o caso a partir de 2003), ou em cenário de estagflação, o mais certo
era que a descida das taxas directoras empurrasse a economia para uma situação
de ineficiência dinâmica - e as
consequências que enunciei mais acima não se fariam esperar.
v Eis
a causa “macro” da actual crise financeira: a economia norte-americana,
preponderante à escala global, permaneceu demasiado tempo num ambiente de ineficiência dinâmica.
v E
os Intermediários Financeiros, para acompanharem o passo das mais valias que
iam surgindo na economia real, tiveram, eles próprios, de se expor às
flutuações dos preços de vários bens transaccionáveis, através de instrumentos derivados
(isto é, instrumentos financeiros cujos activos subjacentes são bens
transaccionáveis).
v Com
a agravante de que vários destes instrumentos
derivados empilhavam risco
de contraparte e, por vezes, risco
de crédito sobre vários riscos
de mercado. E todos esses riscos assim empilhados tinham uma origem
comum – ou seja, estavam fortemente correlacionados (a modos de um castelo de
cartas em equilíbrio instável sobre três palitos).
v Quanto
à Dívida Pública norte-americana, contrariamente ao que seria de esperar, os
efeitos da ineficiência
dinâmica não se fizeram sentir ainda. Por duas razões: (a) a
Administração Clinton legara um stock
de Dívida Pública muito baixo; (b) os países asiáticos absorvem-na
aparentemente sem limite, só para evitar a revalorização das suas moedas
nacionais.
v Enfim,
aqueles instrumentos
derivados vinham colocar a supervisão prudencial perante três
questões complicadas: (a) Como estimar as perdas esperadas naqueles instrumentos derivados?
(b) Como reflectir no preço desses tais instrumentos
derivados as perdas estimadas? (c) Como estimar as correspondentes
perdas não esperadas – o que é dizer, como determinar qual seja o capital
mínimo adequado, dado o risco a que esses instrumentos
derivados expunham? (cont.)
Lisboa, Março de 2008
A. PALHINHA MACHADO
Um comentário:
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