7 de julho de 2017

O Cinema não Demorou a chegar ao Brasil






Trabalho: Arte
Laiza Maria Mendes de Oliveira
O Cinema não Demorou a chegar ao Brasil


O cinema não demorou a chegar ao Brasil. Sete meses depois da primeira sessão patrocinada pelos irmãos Lumière, em Paris, ou seja, a 8 de julho de 1896, os cariocas foram apresentados a um arremedo do cinematógrafo, na mais agitada e novidadeira rua do centro do Rio, a Ouvidor. As primeiras imagens aqui tomadas por uma câmera datam de junho de 1898. Focalizavam a baía de Guanabara e algumas embarcações nela ancoradas. De olho no visor, um imigrante italiano chamado Afonso Segreto, chegando da Europa com sua primeira câmera Lumière.

Por algum tempo, Afonso e seu irmão Paschoal detiveram o monopólio das imagens em movimento entre nós. No início deste século, surgiram os primeiros concorrentes, todos imigrantes como os Segreto. Um deles, Giuseppe Filippi, estabeleceu-se em Curitiba e, mais tarde, em Porto Alegre. A partir de 1905, o português Antônio Leal especializou-se em registrar fait divers e festas populares do Rio. Sangue espanhol tinha o criador do nosso primeiro circuito de salas exibidoras, Francisco Serrador.
Filmes de enredo, só a partir de 1908. O veio foi aberto com uma comédia, Nhô Anastácio Chegou de Viagem, de Júlio Ferrez. Influenciado pelo francês Georges Méliès, Antonio Campos encheu de truques, em São Paulo, o também pioneiro O Diabo. Entusiasmado com as possibilidades fantasiosas do cinema, Antônio Leal trocou o documentário pela ficção. Adaptou O Guarani, de José de Alencar, e com Os Estranguladores descobriu um filão que por algum tempo foi moda no Rio: filmes de média metragem dramatizando palpitantes histórias da crônica policial da época. Nesse terreno, acabou batido por Alberto Botelho, que fez de O Crime da Mala o primeiro estouro de bilheteria do cinema brasileiro.
A febre cinematográfica contaminou quase todo o País. Paulo Benedetti levou-a até Barbacena; Anibal Requião, até Curitiba; Aristides Junqueira, até Belo Horizonte; Diomedes Gramacho, até Salvador. Mas Rio e São Paulo continuaram sendo os dois centros produtores mais efervescentes - e os mais sintonizados com as novidades de fora. No afã de imitá-las, chegamos a produzir até três versões de A Viúva Alegre e uma de A Cabana do Pai Tomás.
Bem mais autenticamente nossa era a sátira política transposta do teatro-revista, cujo exemplar pioneiro, Paz e Amor, realizado em 1910 por Alberto Botelho e W. Auler, já ostentava no título uma gozação ao presidente Nilo Peçanha, que prometera governar o País "com paz e amor". O público adorou, mas nem assim o cinema brasileiro deslanchou de vez. A uma queda na produção, em 1913, seguiram-se mais dois anos de penúria material, provocada pela guerra. Quando se retomaram as atividades cinematográficas, em 1916, a sátira cedeu lugar à velha mania de adaptações literárias e a sagas patrióticas.
Entre 1919 e 1925, sete novos desbravadores entraram em cena: José Medina (em São Paulo), Silvino Santos (em Manaus), Gentil Roriz (em Recife), Eduardo Abelim (em Porto Alegre) e os mineiros Francisco de Almeida Fleming (em Pouso Alegre), Humberto Mauro (em Cataguases) e Eugênio Kerrigan (em Guaranésia). Desses, apenas Mauro conseguiu construir uma carreira e atravessar a ponte para o falado.
Nos anos que antecedem a chegada do filme sonoro ao Brasil, as maiores promessas continuam sendo um privilégio do eixo Rio-São Paulo. O polivalente Adhemar Gonzaga salta do jornalismo para atrás das câmeras, traz Humberto Mauro para o Rio e funda um estúdio. A dupla Adalberto Kemeny e Rodolfo Rex Lustig monta uma produtora (Rex Film) e repete na Paulicéia (São Paulo, a Sinfonia da Metrópole) o que o alemão Walter Ruttmann fizera na Alemanha.
Com uma comédia estrelada pela dupla cômica Genésio Arruda e Tom Bill, Acabaram-se os Otários (1929), o cinema brasileiro entrou na era do falado. Dando as ordens atrás da câmera, o folclórico Luiz (Lulu) de Barros, que faria dezenas de patuscadas afins, ao contrário de Mário Peixoto, que só conseguiria realizar um filme, Limite, o suficiente para consagrá-lo como um gênio da raça. Peixoto e Mauro (sobretudo por conta de Ganga Bruta, 1933) são os dois criadores fundamentais do período, marcado também pela obstinada atuação de uma mulher, Carmen Santos, atriz, produtora, dona de estúdio e, por fim, também diretora, e pelo surgimento dos primeiros filmusicais carnavalescos produzidos por Wallace Downey e Alberto Byington Jr., imitados e aprimorados na Cinédia de Adhemar Gonzaga, com o melhor que o rádio e a música popular tinham a oferecer.
Em 1941, um grupo de jovens abnegados, liderados por Moacir Fenelon, Alinor Azevedo, José Carlos Burle e Edgar Brasil, funda uma produtora independente, a Atlântida, que, desviada de seus objetivos iniciais, se transformaria no mais bem-sucedido estúdio do País em todos os tempos. Seus criadores sonhavam com filmes sérios, algo solenes e engajados, mas tiveram de se amoldar às exigências do mercado. E assim nasceu a chanchada, misto de comédia, musical carnavalesco e filme policial, o mais exitoso gênero cinematográfico que no Brasil vicejou - e que só a televisão, no início dos anos 60, conseguiu destruir.
Enquanto a Atlântida divertia as massas com suas chanchadas, a Vera Cruz, delírio megalômano de um empresário italiano estabelecido em São Paulo, investiu suas fichas num cinema sisudo, pomposo e sem futuro. Hoje, a Vera Cruz só é lembrada pela repercussão de O Cangaceiro e pela passagem, por sua cúpula, do cineasta Alberto Cavalcanti. Em 1954, a Vera Cruz fechou as portas e a Atlântida seguiu em frente, dando-se até ao luxo de bancar projetos mais pretensiosos como Amei um Bicheiro (1953), de Jorge Illeli e Paulo Wanderley, thriller urbano à americana, decalcado no clássico de John Huston, O Segredo das Jóias.
Dividido entre aqueles que pretendiam emular Hollywood e aqueles que viam no neo-realismo italiano a opção mais adequada para uma indústria de filmes modesta e periférica como a nossa, o cinema brasileiro atravessou a década de 50 com certa galhardia, revelando cineastas talentosos como Carlos Manga, Roberto Santos (O Grande Momento, 1958), Galileu Garcia (Cara de Fogo, 1958) e Walter Hugo Khoury (Estranho Encontro, 1958) - nenhum deles tão influente quanto Nelson Pereira dos Santos, sob cujas bênçãos nasceria, no limiar da década seguinte, o Cinema Novo.

Movimento de renovação inspirado na Nouvelle Vague francesa, como tantos outros mundo afora, o Cinema Novo representou a utopia de uma geração de cinéfilos com formação universitária, ideologicamente de esquerda e avessos ao modelo hollywoodiano de produção. Havia, então, um vácuo em nossa indústria de filmes, gerado pelo desaparecimento das chanchadas, que o Cinema Novo ocupou, com a ajuda de uma imprensa também ansiosa por uma imagem diferente do País - mais direta, crua e desmistificadora. À frente dos rebeldes, um baiano inquieto, sagaz e desconcertante, Glauber Rocha, à sombra de quem Joaquim Pedro de Andrade, Paulo César Saraceni, Carlos Diegues, Ruy Guerra, Leon Hirszman e outros traçaram as linhas mestras do moderno cinema brasileiro.
No seu auge, o Cinema Novo, originalmente carioca, deu cria em outros Estados (destaque para o paulista Luiz Sergio Person, autor do fundamental São Paulo S.A., 1965), soube absorver o desafio de seus édipos mais intransigentes (Julio Bressane, Rogério Sganzerla), acumulou diversos prêmios internacionais e marcou de forma indelével inúmeros cineastas de outros países. Também vítima da crise de criatividade que se abateu sobre o cinema mundial, nas décadas de 70 e 80, o Cinema Novo virou apenas um rótulo que, de acordo com as conveniências, pode ser aplicado a obras tão díspares como Lição de Amor (Eduardo Escorel, 1975), Mar de Rosas (Ana Carolina, 1977), e certamente a todas assinadas pelos seus mais notáveis sobreviventes: Diegues, Guerra, Walter Lima Jr., Arnaldo Jabor, Eduardo Coutinho.

No início dos anos 90, nova crise, desta vez interna. Sem qualquer proteção estatal, abolida pelo governo Fernando Collor de Mello, a economia cinematográfica se desorganiza e a produção de filmes chega a zero, ameaçando aposentar precocemente as revelações da década anterior (Murilo Salles, Tizuka Yamasaki, André Klotzel, Chico Botelho) e manter longe por tempo indefinido os seus filhos pródigos, Hector Babenco e Bruno Barreto. Renascendo das cinzas, em novas bases produtivas, o cinema brasileiro promete festejar seu centenário de forma otimista, com surpreendentes fenômenos de bilheteria (Carlota Joaquina, de Carla Camurati; O Quatrilho, de Fábio Barreto) e pelo menos duas esperanças de que melhores filmes virão: Walter Salles Jr., autor dos emocionantes Terra Estrangeira e Central do Brasil, e Jorge Furtado, que fez de um curta, Ilha das Flores, uma obra-prima sem paralelos em sua bitola - por sinal, aquela que para as telas nacionais mais talentos revelou nos últimos tempos.
Com Walter Salles Jr e seu filme Central do Brasil, o cinema brasileiro ganha novo reconhecimento internacional, vencendo o Urso de Prata, no Festival de Berlim de 1998. Em 1999, esse filme recebe indicação para o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e sua atriz principal, Fernanda Montenegro, para Melhor Atriz. Do mesmo diretor, em parceria com Daniela Thomas, é a recente exibição na 23ª Mostra Internacional de Cinema, em São Paulo, do filme O Primeiro Dia, com grandes elogios da crítica quando de sua exibição na Europa, também em 1999.
No início dos anos 90, nova crise, desta vez interna. Sem qualquer proteção estatal, abolida pelo governo Fernando Collor de Mello, a economia cinematográfica se desorganiza e a produção de filmes chega a zero, ameaçando aposentar precocemente as revelações da década anterior (Murilo Salles, Tizuka Yamasaki, André Klotzel, Chico Botelho) e manter longe por tempo indefinido os seus filhos pródigos, Hector Babenco e Bruno Barreto. Renascendo das cinzas, com novos parceiros e em novas bases produtivas, o cinema brasileiro festejou seu centenário de forma otimista, com surpreendentes fenômenos de bilheteria (Carlota Joaquina, de Carla Camurati; O Quatrilho, de Fábio Barreto) e pelo menos duas esperanças de que melhores filmes viriam: Walter Salles Jr., autor dos emocionantes Terra Estrangeira e Central do Brasil, e Jorge Furtado, que fez de um curta, Ilha das Flores, uma obra-prima sem paralelos em sua bitola - por sinal, aquela que para as telas nacionais mais talentos revelou nos últimos tempos.
Com Walter Salles Jr e seu filme Central do Brasil, o cinema brasileiro ganhou novo reconhecimento internacional, conquistando o Urso de Prata, no Festival de Berlim de 1998, e sendo indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1999, e sua atriz principal, Fernanda Montenegro, ao de Melhor Atriz. Em parceria com Daniela Thomas, Salles faria, em seguida, O Primeiro Dia, que grandes elogios da crítica européia recebeu em 1999, para em 2001 bisar o êxito de Central do Brasil com outra obra solo: Abril Despedaçado, adaptação ao sertão do Nordeste brasileiro do romance homônimo do albanês Ismail Kadare. Jorge Furtado, por sua vez, estrearia no longa em 2002, abordando as angústias da adolescência com uma narrativa ágil e diálogos inteligentes, em Houve Uma Vez Dois Verões.
A virada do século foi marcada, ainda, por produções de orçamentos elevados, em geral adaptadas de obras literárias ou baseadas em acontecimentos históricos marcantes, estreladas por astros da televisão e não raro voltadas também para o mercado internacional, como Orfeu (de Carlos Diegues), A Partilha (de Daniel Filho), O Xangô de Baker Street (de Miguel Faria Jr.), Amélia (de Ana Carolina) e Mauá (de Sérgio Rezende). Mas o que afinal predominou foram as produções de porte médio, afinadas com a comédia urbana (Bossa Nova, de Bruno Barreto; Amores Possíveis, de Sandra Werneck), a comédia rural (Eu, Tu, Eles, de Andrucha Waddington) e o thriller de periferia (Um Céu de Estrelas, de Tata Amaral; Os Matadores e Ação Entre Amigos, ambos de Beto Brant).
Estimulados pela retomada da produção, veteranos como Paulo César Saraceni (O Viajante), Ruy Guerra (O Estorvo), Domingos de Oliveira (Amores) e Xavier de Oliveira (Adágio ao Sol), voltaram à ativa, e em outros centros, fora do eixo Rio-São Paulo, jovens cineastas se atiraram à aventura de fazer filmes com entusiasmo fora do comum. A dupla Paulo Caldas-Lírio Ferreira restaurou, a partir de Recife, a velha saga dos cangaceiros, revista por outro ângulo, em Baile Perfumado. No Rio Grande do Sul, o escritor Tabajara Ruas co-dirigiu com Beto Souza um épico intimista sobre um general que lutou nas guerras dos Farrapos e do Paraguai, intitulado Netto Perde Sua Alma .
A despeito do fascínio provocado pela rigorosa transcriação que Luiz Fernando Carvalho fez do texto literário de Raduan Nassar, Lavoura Arcaica, nos dois primeiros anos do novo milênio, os filmes brasileiros de maior impacto junto ao público e à crítica foram, justamente, aqueles que ousaram abordar de frente as mazelas sociais que há tempos mais corroem a sociedade brasileira: o tráfico de drogas, a guerra civil não declarada nas grandes cidades, o fanatismo religioso. O segundo século do cinema brasileiro começou cheirando a pólvora e sangue, a suor e vela, e seus títulos de honra, por enquanto, são Cidade de Deus, de Fernando Meirelles e Kátia Lund; Notícias de uma Guerra Particular, documentário de João Moreira Salles; e os dois documentários (Babilônia 2000 e Santo Forte) que Eduardo Coutinho rodou com a mesma maestria que fez de Cabra Marcado Para Morrer (1984) um clássico do gênero.


Nenhum comentário: