7 de julho de 2017

São Paulo, 8 de agosto de 2001.






São Paulo, 8 de agosto de 2001.



Hoje sou um povo e uma cidade inteira.
Vestido de branco, roupa de luto segundo o candomblé, para levar Jorge Amado ao Jardim da Saudade.
É velado Jorge no dia do aniversário de Caetano Veloso.
Rito de passagem bem óbvio para não deixar dúvida em gente obtusa
no que os céus querem dizer.
O que há de comum entre os dois (Caetano e Jorge) é o prazer pela
vida e o amor pela Bahia.
Os dois sempre cantaram e escreveram sobre ela, mas, sobretudo,
desfrutaram-na.

O destino foi bom comigo e fez deles meus amigos. Mais Caetano,
até pela idade, e menos Jorge.

No dia em que eu e Jorge Amado nos conhecemos, pela mão de
Ludmila Guimarães, amiga mútua, fui visitá-lo em seu apartamento
em Paris.

Ele me levou para almoçar em um restaurante vizinho ao apartamento.
Andando pelas ruas do bairro, senti que Jorge tinha transformado o
Marais no Rio Vermelho (bairro onde ambos moravam em Salvador).

Ele conhecia o cabeleireiro, o açougueiro e era saudado efusivamente
por todos, numa conversa ruidosa própria da Bahia.

Fui pelo caminho pensando algo bem culto para impressionar Jorge
Amado. Para mostrar a ele como eu era inteligente.

Quando finalmente chegamos ao restaurante e sentamos à mesa o
mais teimoso escritor do Brasil, nome mundial Senhor do Rio Vermelho
e do Marais, me disse:

   - Mas Nizan, como é enorme a bunda de Mãe Cleusa!!!!!
Depois de um almoço assim tão profundamente intelectual e delicioso
fui a Fauchon e comprei um licor de 1912, ano em que Jorge nasceu.

No fim da tarde, visivelmente emocionado, Jorge Amado me ligou
para agradecer. Eu, que sou tímido com meus ídolos, me escondia.
Aos grandes a gente não dá, a gente devolve.

E a você Jorge vou fazer seu axéxé, abraçando e beijando Caetano.
Respeitando o fluxo da vida que Nosso Senhor mandou.
Desfrutando mais a Bahia e cultivando-a como você nos ensinou.

E tentando transformar qualquer pedaço do mundo, como você fez,
num delicioso pedaço de Salvador.


"O escritor é um aprendiz do seu
ofício até que deixe de escrever."

Jorge Amado
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