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15 de junho de 2008
Naquele tempo
Naquele tempo...
Naquele tempo as noites uivavam por entre o arvoredo e
havia luas presas nos teus olhos. Eram então bíblicos
momentos...
Eu vinha sentar-me no teu colo sem saber que te
cresciam no peito velhas giestas cobertas pela solidão
do deserto.
Olhavas-me com a placidez dos pastores que guardam
pensamentos antigos na fome calada dos montes...
Vês o meu gesto de abandono? Sou de novo menina e o
teu colo é o baloiço dos meus sonhos.
Tu puxavas-me para o centro do teu corpo, no ponto
onde te crescia a solidão a fundo.
Então o dia clareava em volta dos teus olhos e tu sorrias
com a palidez do sol de Inverno. Talvez o teu amor
nascesse com as estações, nos primeiros botões da
amendoeira e morresse com elas em cada maçã serôdia,
cada folha seca a rastejar na poeira...
Talvez a realidade te habitasse desmesuradamente
para que não tivesses de a habitar mas o certo...
...é que um dia no teu olhar cresceu um tronco e nele
vieram pousar todos os pássaros mortos
da casa abandonada dos teus sonhos.
E eu desfis as tranças e parti para onde as mãos tangem o vento.
Porque naquele tempo ainda existias no fundo da minha boca
como verbo, como carne, como nome, como o ser gramatical
dos versos loucos.
E eu vertia sal na água das fontes, se te sentia à tona do meu corpo.
Ainda não sei se foi o tempo, se a neblina, se um excesso de musgo...
mas no pulsar dos dias perdi a latitude do teu rosto,
excessivamente cavada na memória.
Eu diria, se não fosse dizer pouco, que nasceram flores sobre o teu busto.
deSaraComAmor
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