9 de agosto de 2020

Atrás do barão que a selva enlouqueceu

Atrás do barão que a selva enlouqueceu Marcada por tragédias, a expedição Langsdorff é refeita sob encomenda do canal Discovery O nome do alemão Georg Heinrich von Langsdorff, ou sua versão em russo pós-naturalização, Grigóry Ivanovitch Langsdorff, nada dirá à maioria das pessoas. Poucos sabem que o cientista, cônsul e barão Langsdorff foi o mentor da maior e mais importante expedição fluvial pelo ainda inóspito interior brasileiro. Uma arriscada aventura por 6 mil quilômetros que deixou como legado iconográfico, cartográfico e antropológico cerca de 2 mil páginas manuscritas, 300 desenhos, peças de indumentária indígena e uma série de animais empalhados. A odisséia consumiu oito anos, entre 1821 e 1829, e a sanidade mental do barão, que enlouqueceu no final do trajeto sem ver publicado o resultado de sua minuciosa pesquisa. Essa história será recontada não só a brasileiros como a telespectadores de 100 países no documentário Expedição Langsdorff, da Grifa Cinematográfica. O filme de 52 minutos, co-produzido pelo canal Discovery e patrocinado pela Petrobrás, será exibido no dia 22 de abril como parte das comemorações dos 500 Anos do Descobrimento do Brasil. As filmagens começaram em 16 de outubro, em Porto Feliz (SP), e vão até a metade deste mês, em Santarém (PA), onde acontece a última tomada em território nacional. A Grifa segue parte do trajeto original da expedição, especificamente o trecho fluvial do percurso. A equipe de 11 pessoas viaja em três botes infláveis, equipados com motores de popa, kit de sobrevivência a naufrágio, material de primeiros socorros, minifreezer para guardar os negativos e um telefone que funciona via satélite. Alimenta-se com uma dieta pré-preparada, dorme em seis barracas de camping e leva, para os dias de relax, 11 CDs. Numa segunda etapa, as filmagens vão-se estender até a França (Paris, no castelo dos Langsdorff), a Alemanha (Freiburg, onde jaz o expedicionário) e a Rússia (São Petersburgo, onde estão os desenhos originais). "Pretendemos registrar os mesmos ângulos documentados nos desenhos e nas gravuras originais, mostrando as transformações que ocorreram neste período que separa as duas viagens", situa o diretor do projeto, Maurício Dias, enquanto filma a exuberância natural em Porto Jofre, no coração do Pantanal Mato-Grossense. Uma presença importante na equipe é a artista plástica Adriana Florence. Tataraneta de Hércules Florence, o desenhista francês responsável pela conclusão de três dos diários de viagem da expedição, Adriana é uma espécie de narradora sentimental do documentário, o elo entre os Florence. E também entre o passado, gravado em aquarela, e o presente, que está sendo reproduzido em suas próprias telas ao longo da viagem. "Produzirei dez telas que estarão expostas no mesmo período de lançamento do filme", conta. E antecipa que todo o trabalho irá a leilão, com renda revertida às tribos indígenas a ser visitadas. Neste final de semana, Maurício, Adriana e os técnicos chegam ao trecho mais perigoso do percurso: a travessia dos rios Juruena, Tapajós e Munducurus, entre os Estados de Mato Grosso e Pará. Terão de vencer 1.200 quilômetros em meio a florestas sob condições de navegação e transporte das quais praticamente não há registro. "Corremos o risco de, no mínimo, afundar o barco", adianta Dias. Na expedição do século XIX, só 15 das 34 pessoas que desceram o Juruena permaneceram sãs. As demais caíram doentes de febre ou de malária. Além disso, as provisões estavam no final e, naquele pedaço de selva fechada, havia índios. Daquele período, encontra-se registrado no diário de viagem de Langsdorff: "Desde o dia 24 de abril tenho passado a maior parte do dia e da noite deitado inconsciente, tendo pesadelos fantásticos". Uma semana depois, o expedicionário contraiu febre amarela, perdeu parte da memória e interrompeu as anotações. Voltou para casa. Tinha 54 anos.

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